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lørdag, april 22, 2006

a carta [ao passado]

Esta é uma carta que eu escrevo ao meu eu do passado, antes de vir para a Noruega, e vem no seguimento do post anterior. Por isso, antes de lerem este post, leiam o anterior, caso ainda não o tenham feito.

A viagem está quase no fim. Faltam escassos meses para voltar a Portugal, e as experiências foram mais que muitas. Enumerá-las todas seria exaustivo, e, do ponto de vista da minha querida mas falível memória, impossível, portanto vou apenas mencionar algumas.
O primeiro dia, na chegada ao aeroporto, estava completamente confuso. Pela segunda vez viajava de avião, a primeira desde os nove anos, e a primeira vez sozinho. Depois de 4 horas e de uma escala na Alemanha cheguei finalmente a solo Norueguês, com o coração a bater desalmadamente. Não encontrei a minha bagagem, e encontrava-me completamente perdido, mas acabei de me fazer amigo do largo grupo de AFSers tailandeses, acompanhados de monitores adultos - na verdade o único grupo acompanhado desde o país de origem, julgo eu. E foi assim que cheguei ao encontro dos outros AFSers, onde encontrei os voluntários da AFS, e me fiz amigo com a Anda, da Indonésia, que estava feliz por encontrar outra pessoa que também não tinha mais ninguém do seu país consigo, da Isha e do outro AFSer da Índia (primeiros AFSers da Índa na Noruega, depois de um longo interregno da AFS na Índia, do Mah Rek, ou qualquer coisa assim - chamem-lhe Mike - da China, e com o grupo de tailandeses, está claro. A espera ansiada pelos brasileiros, para falar Português revelou-se infrutífera, pois eles foram os últimos a chegar.
Quando cheguei ao primeiro campo AFS, estavam vários deles presentes. O campo foi uma fantástica semana, ao fim da qual fui viver em Asker, no sul, com a primeira família de acolhimento, temporária. Só lá estive 15 dias, quando o Øystein me foi buscar o mapa, para me mostrar onde eu ia passar a viver: lá bem no Norte, a uma hora de Tromsø, acima do Círculo Polar Árctico. Entrei em pânico, mas nos dias seguintes acabei por me habituar à ideia, e nunca mais vi o grupo coral que tinha sido a primeira actividade em que me inscrevi em Asker, para arranjar qualquer coisa para fazer.
À chegada ao Norte a família levou-me ao Peppes Pizza em Tromsø, para nos conhecermos, juntamente com Aslan e a família dele. Quando fomos para casa parámos para visitar o far (pai, em norueguês, para simbolizar pai de acolhimento), que trabalha por turnos, e estava precisamente a prestar serviço naquela noite. O primeiro dia na escola foi assustador. Não sabia onde é que devia ir, não percebia nada de norueguês, não sabia quem era a minha turma e as aulas já tinham começado há uma/ duas semanas. Perguntei, em inglês, a um grupo de pessoas que estavam na cantina se sabiam onde é que eu tinha de ir, se eram do terceiro ano, mas eles disseram que não e riram-se... Os primeiros tempos não foram fáceis. Tinha saudades dos amigos AFSers deixados no Sul, não conhecia ninguém na escola, nem percebia as aulas. Comecei a frequentar os treinos com a equipa de fútebol, mas não durou por muito tempo por causa da chegada do Inverno, e tivemos que esperar meses até começarmos a treinar dentro, no pavilhão.
Avancemos rápidamente, até ao Natal. A pouco e pouco as coisas vão-se compondo. Eu e o Aslan apoiámo-nos mútuamente na descoberta da Noruega, procurando coisas para fazer, aprendendo norueguês em conjunto. O Natal na Noruega é um espectáculo. Existe tudo de natal: cortinados de Natal, chá de Natal, café de Natal, marsipan (doces de amêndoa idênticos aos do Algarve mas não tão bons, acho que já os mencionei na crónica da páscoa) de Natal, cerveja de Natal, refrigerantes de Natal, bonecos de Natal espalhados pela casa. Um conjunto em semí-circulo de lampas eléctricas que se chamam adventslys e que estão ligadas, nas janelas de todas as casas, durante as quatro semanas do advento, não falta à festa. Escrevem-se e recebem-se postais de Natal. Existe um enfeite comum que consiste em espalhar uma certa espécie de especiarias sobre uma laranja, depois entrelaça-se com uma fita e pendura-se à janela por exemplo. O aroma é excelente. Eu fiz um, a fotografia está ao lado.
Para além da festa pré Natal, existe mais festa. No segundo dia de natal, segundo dia de natal, etc. (andrejuledag, tredjejuldag, etc.) existem mais festas e concentrações familiares. Até que chega o dia de Ano Novo. Quando bate a meia noite, toda a gente faz estalar no céu o seu próprio kit pessoal de fogo de artíficio, o que significa que se vê fogo de artíficio em todas as direcções durante quase uma hora, até toda a gente ter acabado.
Durante esta época estamos no tempo escuro - mørketid. No seu auge o dia resume-se a umas duas horas de luz azul. Durante dois meses não se avista o sol, mas durante um largo tempo disfruta-se da luz de pôr-do-sol ou de nascer-do-sol. Quando o sol volta é que nos apercebemos o quanto ele nos fez falta, e enchemo-nos de alegria, mas a luz cor-de-rosa que é emanada durante o mørketid é também excelente.
As férias de Inverno - vinterferie - chegaram depressa. Fomos a Abisko, na Suécia, onde púde experimentar slalom pela primeira vez, mas só na pista verde, mais fácil, porque estava doente e não púde ir todos os dias. Na semana seguinte viajei até à Polónia e à Alemanha. Mais uma vez andei de avião. Uma viagem de ida, e outra de volta. Contando com a viagem que fiz de Oslo até Tromsø, para vir aqui viver, já me posso considerar bem mais experiente nestas viagens aeronáuticas. Durante a viagem acabei por me entrosar também melhor na minha turma, ficar a conhecer dois países e ter a possibilidade de experienciar a violenta memória silenciosa dos campos de concentração.
Desde aí que jogo todos os dias Fang, uma espécie de poker sem dinheiro envolvido, à hora de almoço. Já aprendi vários jogos de cartas, como o President, o Idiot, o Fang, o Omber (jogo turco), o Truco e o Caixeta (jogos brasileiros) e também a Canasta. Entretanto visitei também um hotel de gelo na Suécia. Outras experiências incluem um passeio num trenó puxado por cães, o esqui que costumo praticar às terças feiras ou o Polarbadet, um complexo com piscinas, escorrega de água, jacuzzi, saúna, banho de bolhas, etc., tudo isto enquanto lá fora, pela janela, vemos a neve e o frio. Na páscoa, em vez de esperar a visita do padre a todas as casas da aldeia antes de me começar a deliciar com todos os doces sobre a mesa, fui esquiar na área ao pé da roulotte. Ainda me lembro da primeira vez que estive naquela área. Ainda não havia neve nenhuma. Eu tinha então apenas visto neve por duas vezes, uma na Serra da Estrela e outra na aldeia onde o pai nasceu, e só nesta última é que vi nevar - e a neve evaporou-se em poucas horas, e tornou-se água. Este ano tive largos meses cheios de neve.
Em breve vou com a família à Finlândia, para mais um fim-de-semana de slalom e/ou snowboard. E depois é o Russetid, o tempo de festa dos finalistas do secundário na Noruega. Para colecionarmos coisas para pôrmos nos nossos chapéus tradicionais Russ temos que fazer certos desafios, como por exemplo gritar Skål (À saúde) de 5 em 5 minutos numa aula, ou vir de pijama para à escola. O Russetid acaba a 17 de Maio, dia nacional da Noruega (a dissolução da união com a Suécia ocorreu nesse dia, no ano de 1905). Vai haver uma parada, vamos comer muito gelado, vai haver uma grande festa, as bandeiras vão súbir aos mastros nas casas dos patriotas noruegueses - há um mastro em cada rua. Depois pouco falta para o sol da meia noite. E depois chega Junho. Quando o tempo de testes e exames, que começa já daqui a duas semanas, acabar, já está quase na hora da despedida. A 1 de Julho tenho que estar em Portugal.
Às vezes quando penso no passado, nas pessoas que me chamaram maluco quando lhes disse que vinha para aqui, sinto-me orgulhoso. Às vezes quando penso no pouco que sabia, na nova língua que aprendi, nas novas experiências que tive, sinto-me completo. Recebi hoje uma carta tua, eu-do-passado, espero que estejas orgulhoso de mim.

6 Comments:

Blogger K said...

É assim mesmo que te deves sentir Web: orgulhoso.
Um abraço

1:07 p.m.  
Anonymous Anonym said...

Adorei o relato.
E estás tu orgulhoso e eu também.

8:40 p.m.  
Blogger António said...

nao sei se ja reparaste mas essa do abominavel homem das neves está registada :)

Escassos meses é ainda muito, muitos dias. Muito dia!:)

1:13 p.m.  
Anonymous Anonym said...

Enjoyed a lot!
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11:12 p.m.  
Anonymous Anonym said...

Best regards from NY! » »

3:49 p.m.  
Anonymous Anonym said...

Where did you find it? Interesting read »

10:33 p.m.  

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