as quedas chegam quando menos se esperam

Todas as terças-feiras, se não também às segundas, ou às quartas, ou às quintas, mas, pelo menos, às terças-feiras, lá pego eu nos meus esquis smørefri - não desliza tanto o que permite subir mais facilmente... e não descer tão rapidamente - e vou para a "pista local". Às terças eu não falho, até porque o far vem comigo. Ontem experimentei pela primeira vez a pista de 5 km. 5 km ainda são um bocadinho e, estando apenas -4°C - sim, apenas, vejam varm (calor) no dicionário norueguês - acabamos por suar bastante e sentir uma grande necessidade de remover o meu raincoat. Mas enfim, apesar de tudo não vacilei. Ou melhor, vacilar, vacilei, porque, sejamos sinceros, a queda é impossível de evitar.

O ponto alto do passeio foi mesmo o ponto alto do passeio. No alto da montanha deslumbrei-me com a panorâmica Lá em baixo as luzes das terras em volta de Balsfjord eram reflectidas no espelho aquático do fjord. Eram tremeluzentes linhas amarelas, mágicas; a água era negra, o céu era negro e a lua pálida atrás das nuvens translúcidas.

Com os esquis novamente na pista, procurando fazer deslizar o esqui esquerdo, o direito, o esquerdo, o direito, com o mesmo compasso para as skistaver, os apoios que se utilizam no esqui - como se diz em português? - lá segui, até que, numa das descidas, mais precisamente numa curva, acabei por sair da pista, que não estava em muito boas condições naquele preciso lugar. Caí também na maior das descidas, e não fiz a segunda maior (vim pelo caminho que se usa para subir, a inclinação era menor) porque a pista não estava em condições e já era díficil o bastante se estivesse.

Quando saí para o esqui já sabia que ia cair, o que me causava um bocado de incómodo e hjertbank, que é como quem diz, um coração aos saltos. Apesar de tudo cair na neve não aleija, principalmente quando a queda é esperada. Mal sabia eu que os esquis era o que ainda me mantinha em pé. No caminho de regresso a casa decidi só tirar os esquis depois da primeira e menos acentuada de duas descidas que se tem que fazer antes de lá chegar. Pronto, chegou a hora de tirar os esquis. A estrada tem mais gelo que neve, em verdade se diga, não está próprio para esquiar o caminho todo. Retirei os esquis e é precisamente depois de os tirar aos dois que dei violentamente com o meu corpo no chão - perspectiva lateral. A estrada estava mesmo feita em gelo e a minha perna ficou bastante dorida. Nada de grave, mas definitavamente desconfortável. A verdade é que o homem cai por natureza e por acção da gravidade, que não é mais do que a natureza. Pode cair no gelo ou cair na neve; pode preparar-se ou não se preparar; e muitas vezes as quedas que receamos mais são as que menos aleijam. Estas são as conclusões práticas da minha experiência, as filosóficas tirem-as vocês próprios.

Uma vez que sou tão maus de esqui nos pés como depois de os retirar, decidi aqui, desde já, que por muito que melhor não me candidato aos Jogos Olímpicos de Inverno de Vancouver 2010, e que portanto isso significa que o Danny Silva vai continuar a ser o nosso único representante se entretanto não passar a reforma, a não ser que Pedro Albuquerque desenhe também as mascotes para esse evento, como para este desenhou a Aster, Neve e Gliz. Entretanto, se também vocês quiserem aprender a esquiar: um, preparem-se para se levantarem, porque para a queda acontece, quer se preparem quer não; dois, usem este manual on how to sky and how not to de 1912 (nesta parte os desenhos parecem-se bastante comigo...)